quarta-feira, 30 de outubro de 2013

Passa cada estação
Entre céus e purgatórios
Morre todos os dias o poeta
como um poço de efemeridade,
Mas logo renasce
A cada verso.

E pesa, a dor e o sentimento
O coração e as lágrimas
Como a pena que suporta 
O peso da mão

Seguem os versos
Em linhas tortas
E o poeta morre todos os dias 
Para que a poesia nunca perca 
Sua vivacidade.

domingo, 20 de outubro de 2013

De quem é o olhar


De quem é o olhar
Que espreita por meus olhos?
Quando penso que vejo,
Quem continua vendo
Enquanto estou pensando?
Por que caminhos seguem,
Não os meus tristes passos,
Mas a realidade
De eu ter passos comigo?

Às vezes, na penumbra
Do meu quarto, quando eu
Por mim próprio mesmo
Em alma mal existo,

Toma um outro sentido
Em mim o Universo -
É uma nódoa esbatida
De eu ser consciente sobre
Minha ideia das coisas.

Se ascenderem as velas
E não houver apenas
A vaga luz de fora -
Não sei que candeeiro
Aceso onde na rua -
Terei foscos desejos
De nunca haver mais nada
No Universo e na Vida
De que o obscuro momento
Que é minha vida agora!

Um momento afluente
Dum rio sempre a ir
Esquecer-se de ser,
Espaço misterioso
Entre espaços desertos
Cujo sentido é nulo
E nem ser nada a nada.
E assim a hora passa
Metafisicamente.

                                                                    Fernando Pessoa, ''Cancioneiro''

segunda-feira, 14 de outubro de 2013

Meditação sobre o café

Desajeitado e descontente
olhou para a mesa, uma xícara.
Bebeu um gole do café
amargo e frio

Olhou para a asa
da pequena xícara
Pensou que poderia ter asas
Desviou o olhar 
e tomou outro gole.

Desconfiado e com os olhos
agonizados
deu o último gole
e nada mais fazia sentido.

Black Hole

E é estranho tudo isso, a maneira como se movem as coisas, as pessoas, os caminhos, todos perdidos à procura do que lhes consola. As coisas grandiosas, como a vastidão do universo ou mesmo o negro vazio da noite... essas não assustam, pelo contrário, elas amenizam, são condolências ao ato de viver. Me assusta a insanidade contida nos olhares vagos, das pessoas que por esse lapso temporal coexistem. Me instiga a necessidade de ser ou mesmo a sua falta, daqueles que humanos se intitulam. E a Terra, em seu movimento de rotação, segue perdida na imensidão do nada. E nesse perdido, os perdidos marcham sem saber o que procuram, sobrevoam e declinam-se, rastejam prostrados, com máscaras hostis, caindo o tempo todo em armadilhas, por eles armadas. E se entorpecem com suas frivolidades, e rodam, e preenchem o ego da forma mais suja , e caem em si. Montam, se remontam e são dados por perdidos, mais uma vez. Tudo é um grande martírio, que segue à destruição própria. Chega um dia em que serão lembrados de estarem sempre esquecidos. E assim se movem, se agonizam no mais alto grau de sua insignificância. E nada mais saberão, de um tudo que jamais será resgatado.

sábado, 12 de outubro de 2013

Oraison du soir - Rimbaud

[...]
Tels que les excréments chauds d'un vieux colombier,
Mille rêves en moi font de douces brûlures:
Puis par instants mon cœur triste est comme un aubier
Qu'ensanglante l'or jeune et sombre des coulures.
[...]

quinta-feira, 10 de outubro de 2013

Ondas vermelhas

Assim segue.
Procura o perdido
que restou naquele olhar.
Aquele que em gestos
fugidios, tímidos e harmoniosos
em sua busca se consolidou. 

As mãos gélidas.
O peito disparado,
que agora tortura-se,
toma dimensão tamanha...
comparada a uma infinidade universal
E não se suporta ali, entre átrios e ventrículos.

Se exige mais.
E o silêncio toma conta,
como uma expressão da desordem
contida na mente.
E para , e sente, e dói, e anda
e silencia... mas não consegue!

De uma veemência insólita
que do fôlego lhe parte
procura mais uma vez o perdido.
E ama o perdido
tal como quem enxerga o horizonte, prevendo eternidade.

Absorto, sutil e melancólico.
Assim segue... condoído.  
Carrega o deleite e a aflição
que agora o inteira. Já é noite.

Dessa forma suspira,
E auspicioso espera que a alvorada
um dia ainda o leve

em ondas vermelhas. 

domingo, 6 de outubro de 2013

Do sentir insano

E assim ao
lançar olhares,
nada saberás.

Nada faz sentido
quando se sente

Se o peito flameja
e o olhar vaga...
Esqueça o que circunda-te.

Nada faz sentido
quando se sente

Agora resta o nada,
que ao tudo deu causa.
Resta tu, alma vaga
de corpo erradio.

Esqueça-te das páginas
que agora amarelam-se
na última gaveta
dos teus pensamentos perdidos.

Nada faz sentido
quando se sente

Foi um dia
em que era senhor de tuas ideias,
mas agora te tornas escravo.

Resta-te o nada de viver,
submerso nas sensações
perdidas do sentir.

E assim vagueia...
Voa como um
pássaro sem ninho

e que, sem solo
não encontra lugar pra repousar.
Mas isso tampouco importa.

A consciência própria
de teu estado pueril,
condena-te à dor...
à dor que deveras amarra-te.

E por essa razão
te lanças ao mar das intensidades,
aos ditames de tua inconsciência
que não nega o sentir.

Nada faz sentido
quando se sente

Esqueça-te agora
que és razão
e lembra-te que és substância...
que és humano.

Vejas! De tu foras roubada
a incolumidade
e a certeza de teus passos.
Mas o brilho, à visão retorna.

Entrega-te à desrazão total
de teu íntimo,
pois o cintilar nos olhos
é mais importante que o sentido de tudo.

Pois nada faz sentido
quando se sente.





                                                               Àquela que me tira a razão.

quinta-feira, 19 de setembro de 2013

Bloody heart

And you, dear girl... 
What have you done to me? 
I just can't look into your eyes 
Without gaze your countenance 
Pure, simple and insane.

Is like a rare gem ... 
I wish , but I haven't.

I really would like to tell you
I wish! Just wishing...and
Surviving with damage 
in my bloody heart.

domingo, 15 de setembro de 2013

Caminhada

O meu sentimento, 
se funde no limiar
da aridez de minh'alma

O mundo vasto 
é agora meu inimigo
me massacra,
trucida, engole
e regurgita.

Extenuado,
meu eu agora segue
contido e sem forças
Caminha para o fim
e nada mais.

Através de um espelho - Bergman

"Amor e deus são a mesma coisa, esse pensamento ameniza o meu vazio e meu desespero sórdido. De repente, o vazio se transforma em abundância e o desespero em vida. É como a suspensão temporária de uma sentença de morte."

sábado, 14 de setembro de 2013

Rock souls

In this weird swamp of life, the wandering souls survive with damage hearts.

Subterfúgio.

Um bolha eu diria. Sim uma bolha delgada e frágil. Inflamos esta tal bolha ao nosso redor, uma bolha imaginária. A todo tempo a inflamos, apenas para guardar nossos jogos ocultos, as incógnitas, apenas para afastar aquilo que não faça parte da nossa estratégia secreta. Mas a cada vez que a vida estoura esta bolha, estes jogos tornam-se estranhos, irrisórios e  infames.

terça-feira, 10 de setembro de 2013

Nowhere man.

O corpo pesava mais que a densidade maciça do chumbo. A penumbra causada pelo tímido sol daquela manhã direcionava ao leito uma coloração acinzentada, tal como aquela alma flutuante. Era notório que aqueles olhos cerrados já não mais enxergavam.  Hoje cedo ninguém o visitara, nem mesmo durante todo o dia, nem mesmo em seu passado não muito remoto, ninguém nunca o visitara. O preço de conhecer-te bem é este meu caro amigo, conheça por inteiro a ti mesmo e viverás em segregação total. Loucura? Talvez um submundo sem cores ou um existir mesmo sem rumo. Mas assim o fora e assim se acabou. Foi homem de lugar algum. O cheiro insuportável toma conta do aposento e o sol a pino clareia e ofusca o corpo já em desintegração. Ninguém nunca soube, nem mesmo saberá.

quinta-feira, 22 de agosto de 2013

Desalento



Um espectro negro bateu à porta, e sem pena quebrou essa barreira, que aparentemente dotada de solidez, agora se mostrava fraca... Entrou e perfurou este invólucro sobreposto de dermes,  adentrou tal seio fragilizado por quimeras de um estado caótico... Perfurou-lhe cordialmente, assim arrancando-lhe o rubor sanguíneo e preenchendo de um vazio acinzentado. Prostrado, como um corpo que flutua sem destino, sentou-se ao seu lado a dona dos trajes negros, ali ficou por horas... Ela então, resolveu que ao corpo faria companhia,  ali permaneceria e compartilharia toda agonia funesta desse alguém que nada só. Olhares perdidos, procurando algo inexistente, um leito talvez, no qual pleiteasse alguma plenitude. Sem forças, com espectros escuros , de alma rendida... Passou ao estado de dor absoluta... Até que a insanidade tomou conta... Acordou o corpo, sem vez na realidade... Mas agora noutra dimensão.

sexta-feira, 12 de julho de 2013

Plasticidade

Toda essa loucura de estar vivo não faz mesmo algum sentido, o próprio ato de se sentir já qualifica a razão de ser, a falta de razão é o que deve lá fazer algum sentido. Existir é como ser um saco plástico que se esvoaça por aí, é composto de matéria, mas por dentro é preenchido por um vazio, e o vento que o leva ,o enche e o impulsiona, é o vazio em si a razão que o move. Até que o vento o empurrando, o empurra para tão longe, que logo se perde noutros rumos, e desde já o vazio que preenche o saco plástico agora tem sentido. O vento sopra pra longe, e assim vai o saco, mas uma hora o vento acaba. O que resta é a matéria, é o plástico. O plástico que cái em terra para se decompor em meio aos mineirais. O ser é o plástico, o vazio que o vento preenche uma hora esvazia-se de vez. O ser é o plástico, o ser detém uma plasticidade que o faz mudar de rotas durante todo um ciclo, para num final se plastificar no fim obscuro de sua própria matéria.

terça-feira, 25 de junho de 2013

Dízima periódica

É que o matemático
Um dia desses,
cansado de seu mundo
          retido
Pela precisão de seus cálculos

Calculou o sentir.
Num papel pequeno com sentimento incalculável
E sem a calculadora
Dividiu o sentir pelo sentimento
E como resultado:

Descobriu, em primeiro momento
Uma certa certeza de que sentia algo, antes da vírgula
Mas concluiu, chegando a conclusão alguma
Que depois da vírgula, o sentir era
Uma verdadeira dízima periódica...

domingo, 12 de maio de 2013

Essa estória de estar sempre presente sufoca o ideal do eu poético, que precisa de tempos em tempos sair de cena, para depois voltar em grande estilo. Pois só assim se cria aquele certo anseio de se achar nos perdidos da vida. Desaparecer, espairecer e reaparecer, três verbos que tornam a vida humana menos medíocre.
É que as vezes, o peito ,de certa maneira escarnecido ,precisa daquilo que se chama de trancamento. Trancar,chavear vedar e jogar a chave fora, afim de que um dia alguém acerte a fechadura. De peito aberto só anda quem tem amor.

sexta-feira, 3 de maio de 2013

Feeling

Talvez essa tal rudeza fática
de meus versos
cause em teus orgãos internos
uma tal de malemolência

Mas desculpe,
é apenas um reflexo empático
que do teu fitar
me cala a boca
mas não os versos.

quinta-feira, 2 de maio de 2013

Homeopatético

Fustigado o meu peito
apelo às palavras
Que em pequenas dosagens homeopáticas
vão curando a vastidão
da ferida da alma

terça-feira, 30 de abril de 2013

Descreve Mia Couto

"Qualquer coisa
pergunta-me qualquer coisa
uma tolice
um mistério indecifrável
simplesmente
para que eu saiba
que queres ainda saber
para que mesmo sem te responder
saibas o que te quero dizer"

In.:"Pergunta-me". COUTO, Mia.







sábado, 27 de abril de 2013

Sentença de desmérito

A sentença foi essa, viveu um amor de dolo eventual. Tropeçou em seu sentir, pugnando à outra parte a perda por negligência, imprudência e imperícia.

Perda

O motivo da angústia
Não veio de longe
Veio, apenas, de dentro
Crepitando em chamas
A ausência da amada

Ardeu em descomum
Descontentamento
E a dor da perda invadiu
Os restos de um ser
Já dilacerado

Chamou um passado
Evocando-o de maneira gritante
e com tamanho infortúnio

Mas agora, como resposta
Ecoou na nebulosa penumbra d'alma
Um futuro perdido.

sexta-feira, 26 de abril de 2013

terça-feira, 23 de abril de 2013

O reflexo

Os ares ofegantes de uma rotina fastisiosa, roubou-lhe do semblante o regozijo que traria qualquer criatura em plano terreno. O constante desalento aplicou-lhe na face uma superdosagem de um enrijecimento que fugia às explicações comuns. Algo nada normal lhe viraria uma rotina, era a falta de achar em si o que verdadeiramente seria. O enrijecimento muscular das proeminências faciais, aquilo que mais comumente denominar-se-iam bochechas, destacava a expressão da falta de amabilidade e simpatia deste ser prostrado e sem identidade. Uma espécie de derretimento da face, puxava para baixo a abertura bucal daquele rosto encharcado e enrijecido de prostração. Difícil explicar a complexidade e o grau daquela massa epidérmica facial. Como se uma certa força gravitacional agisse ali, regendo e repuxando para a parte inferior toda a expressão e a falta de sorriso. Olhar aquele rosto seria ter à vista uma falta de agradabilidade, um certo desconforto, sendo algo disforme e desproporcional. As rugas ,amontoando entre si,  marcavam a falta de expressão, ou melhor aquela velha e indisposta expressão rígida e desprovida de viveza. As pálpebras caíam sobre os olhos e estes que por sua vez tão caídos, aludiam a um peixe quando perde a vida. Uma tristeza singular tomava conta daquele pobre rosto, um sentimento ruim, encrustado carnalmente na velha face. De certo, não sabia o motivo para essa velha expressão, simplesmente não procurava nem tampouco sabia o porque daquele enrijecimento. Aliás, somente ele não o sabia. Caminhando absorto e com o mesmo semblante de outrora, encontrou ,certo dia, um certo objeto desconhecido por si, nada igual havia já lhe aparecido na frente. Um pequeno quadrado, de dez por dez centímetros, de vidro polido e metalizado que refletia e reproduzia em si a imagem do velho semblante, sim, tratava-se de um espelho. Deslumbrado com a imagem nunca vista antes, o velho rosto, diante do espelho foi colocado à prova. O homem agora observava cada minúcia de detalhe, perdendo-se a todo instante, querendo captar cada linha, pêlo e célula. Mas algo estranho ocorreu-lhe diante da situação, o velho homem de semblante paralítico começara a sentir o amolecimento de seus músculos. Reverteu-se a gravidade antes presente, e diante do espelho surgiu-lhe no rosto um breve e natural sorriso. Agora tudo fazia sentido. O homem amolecendo a face, sorriu para o mundo, havia ali se descoberto. Mas um momento, uma bizarrice maior sucedia, muito cheio de si, o homem agora descoberto, para mais uma análise de si, voltou a se ver diante da superfície refletora. Mas que bobagem, o espelho nunca mais refletiu sua imagem. Foi o drama deste que viveu por viver e acabou, mesmo ao final, sem identidade.

Peças e despedaços

no meu caminho
deixo a marca 
de despedaços
que durante esta marcha
do martírio de viver
só fizeram sentido
diante o mistério 
de perdê-los

mas caminhando
desconstruí a realidade
desmenti a verdade 
e escrevi para viver

o fim da linha chegou
e agora todo quebra-cabeça
em pedaços se remonta

as peças somente no fim fazem 
o sentido.

É o relato de um alguém
que viveu.

domingo, 21 de abril de 2013

Viúva negra

Entre tremendo tormento
o velho Bento
despediu-se de Maria

pois, cansado da vida,
soterrou-se no solo
e partiu pra eterna calmaria


restou ao destino,
pôr fim à solidão de Maria
casando-a com Constantino


Mas a história não acaba.
Constantino também definhou-se,
pondo Maria em desatino.


E assim o foi com os outros
dez maridos.
Era a sina da viuveza de Maria.


Descreve amigo Vinicius

"Como a criança que vagueia o canto
Ante o mistério da amplidão suspensa
Meu coração é um vago de acalanto
Berçando versos de saudade imensa"


In: "Soneto de Contrição"

sábado, 20 de abril de 2013

A partida.

À espera do próximo trem, empilhou as  malas, como um engenheiro que planeja o lugar de cada tijolo do enorme edifício, assim o fez com as malas,tentando planejar um futuro, até então, incerto. Submeteu-se à tal situação, desde que resolvera sair da cidade, não importava o destino, importava apenas, pôr ali, um ponto final e partir. E partiu. Olhou no pulso o relógio, já era quase hora, partiria dentro dos próximos quinze minutos. Tirou a poeira do paletó engomado, lustrou o sapato, ajeitou a aba do chapéu e procurou nos bolsos, o perdido bilhete de passagem. A preocupação tomava forma nas rugas de sua testa franzida, que juntamente dos passos dados pra lá e pra cá, agonizavam qualquer transeunte que ali ao lado passava. Mas era preciso partir, ali jazia toda uma história. Agora eram dez, os minutos restantes. Esperou os próximos cinco minutos, como quem espera a passagem de cinco séculos. A ânsia da partida lhe  açoitava o peito, agonizando em sua mente as lembranças deste lugar que logo, dentro de minutos, deixaria. Mais uma vez arrumou a aba do chapéu, colocou os óculos escuros e abriu diante da face o jornaleco da pequena cidade. Os passos eram cada vez mais apressados, dava voltas num movimento de rotação acelerado. Esperar mais três minutos, o trem que parecia nunca chegar, tornou-se um martírio. Arrumou mais uma vez o disfarce, olhou para os lados e desconfiou dos passantes. Ajeitou a lapela, empilhou as malas, guardou o jornal e olhou no relógio, agora dois minutos restantes. Certificou que estava ali, dentro do paletó marrom, a quantia recebida, uma farta junção de notas verdes, guardadas dentro do envelope surrado. Passaria, longe dali, uma boa vida que viveria às custas do recebido pelo feito. Estava sedento pela chegada do trem, que agora, não tardava um minuto. Enfim, a grande máquina de ferro anunciou sua chegada triunfante, que naquele momento entrara na plataforma da estação. No rosto, abriu-lhe um daqueles sorrisos sarcásticos. Deu então, o primeiro passo porta a dentro. Escutou a voz que, do fundo da estação chamava seu nome. Virou-se, e naquele triste momento, um sujeito apareceu, e de forma impiedosa, sacou o ferro, apertou o gatilho e desferiu-lhe três tiros, dois no peito e um ao vento, tomou o envelope e fugiu. O paletó marrom, agora coloriu-se com uma grande mancha rubra. Zero minuto e o trem partira , partiu também o forasteiro jurado de morte.

Mots au vent*

A arte de ser intangível, 
é o que separa o poeta
 do mundo real
,eis que sua profissão, 
de função inacabável,
 lança ao v e n t o 
palavras 
que ao dia do porvir 
servirão de acalento,
 aos tristes olhos 
de quem agora 
descreve estes versos 

sem talento.






                                         *palavras ao vento




                           

in Pacto



Dizei-me junto ao tempo
E junto a mim
que o amor ganha força
somente dos momentos
junto de ti
                               Exclua os intervalos                  distantes

Porque nenhum tempo
-nosso-
foi feito para não amar.

segunda-feira, 15 de abril de 2013

Um bilhete ao Tempo

— Olá Tempo, desculpe-me, mas terei de falar com certa aspereza, o que acho plenamente justo diante de sua rispidez. Nada mais injusto e imcompreensível que o tempo. Não gosto de você, Tempo. Não me compreendes? Não peço nada mais que inverter-se e seguir o meu próprio tempo. Ah, como queria eu, ser teu dono, Tempo. Inverteria os ponteiros e tiraria as engrenagens deste objeto que carrego no pulso. Não te peço muito, peço apenas seu controle. Como seria mais fácil, eu dono de ti, somente para tê-la em meus braços. Inverteria a regra sexagesimal de seus segundos, minutos e horas, apenas para prolongar os rápidos momentos que perto dela permaneço, e retardaria a contagem do tempo nos momentos em que distante dela estou. Mas não, insistes em ser ríspido comigo. Dê-me tempo! Eu não peço nada mais que tempo. Tempo meu e dela, tempo nosso. Estou contrariado contigo, Tempo... dê-me apenas tempo...

Ass.: um amante

sábado, 13 de abril de 2013

Ares anamnésticos



Puxou o fôlego e apurou de sua memória poucas e vívidas lembranças. As recordações táteis e sensações insólitas lhe deram o ar de revivescência, não este ar que se encontra na atmosfera, não qualquer ar, mas aquele que, realmente, lho fazia respirar. Era um ar assim, de gosto e de cheiro, palpável e visível, que lhe permitia respirar momentos de sua lembrança e em insana consciência viver o momento pretérito, ali e agora, e projetar na tela de seu consciente, ou melhor, desconsciente, todos instantes intensamente vividos e saudosamente inacabados. Soltou o fôlego, respirou o ar, agora atmosférico, e prosseguiu os passos. O Presente lhe chama.

terça-feira, 9 de abril de 2013

Unidade de Tratamento Interno


Incomodado pela tremeluzente luz branca a ofuscar-lhe a retina, (mesmo que de pálpebras cerradas), tentava desesperadamente, sem êxito, abrir o olhar à procura de um esclarecimento da situação. Com os sentidos à flor da pele, vivenciava cada pequeno fato de forma sinestésica, como os passos, que do corredor silencioso se aproximavam cada vez mais, causando-lhe na mente um infernal barulho de martelo. Ou mesmo as gotas pingando com a força que cái um meteoro, sentindo nas veias o transpassar gelado do líquido viscoso, que das artérias às organelas celulares iam distribuindo cada elemento químico de forma elementar. A loucura dos clamores vindos de macas vizinhas ecoavam, em seus tímpanos, agora mais sensíveis que uma película d'água, e crivavam-lhe nos neurônios de forma a interromper as sinapses, ocorrendo-lhe no ser a demência e desvarios de seus colegas enfermos. Confundia agora, o ser real e o imaginário, já não mais sabia sua colocação no tempo e no espaço. De súbito, como uma alma que cái no corpo ao acordar de um sonho, quis com toda veemência física do corpo levantar-se, mas tarde demais, os membros locomotores encontravam-se ali, fortemente atados à gélida plataforma metálica. Pôs-se à prova, a maior insanidade que pode um ser-humano, perder o controle de si, vivia um mundo de pulsações convulsivas e delírios. A brancura do ambiente hospitalar fora tanta que penetrou-lhe o ser, roubando o rubor sanguíneo da pele, congelando a alma e atribuindo-lhe o estado lânguido que trazia o desfalecer do ente. Não restava outro diagnóstico, o aparelho ao lado já não mais soltava o bip que tem um ser em vida. As ondas já não mais seguiam o ritmo de uma variação compulsória, restava apenas uma linearidade cartesiana que calou uma vida, uma voz e um ser. Só não calou a voz do médico, que ao final, apenas disse : "Desliguem os aparelhos!".

quinta-feira, 4 de abril de 2013

Erro de amor, apenas gramatical.

o que dizer, de quando
a parcela 'se' lhe persegue
colocando um 'porque'
nesta situação?

Não se tratava de 
uma questão amorosa
seria apenas, gramatical

Negou o 'se' e
afirmou o sentimento
não o amoroso
apenas, gramatical.

terça-feira, 2 de abril de 2013

Tragamento

Trago dentro de mim
[assim como a fumaça
Branca do cigarro]
-Palavras-
[que diferente da fumaça
branca do cigarro]
Não passam das cordas vocais.
Apenas se esfumaçam no papel.

Não sou fumante, mas traga cá
um maço vocabular.

segunda-feira, 1 de abril de 2013

Quiz


E o que é importante?
Insistir em buscar a verdade
ou a ilusão para forjar a realidade?
Mal soube responder você, ora pois
quem dirá ele, o poeta.

Afinal, a poesia é uma grande
-mentira-
Bem contada.

Contratempo

Era sempre a mesma dúvida. Sempre que acordava, sobre o criado-mudo, certificava-se das horas e amaldiçoava o calendário. Era a rixa constante contra o tempo. Mas era assim, não gostava, aliás, detestava que lhe datassem a vida. Para o pequeno poeta o que lhe importava era o quando.

Sinal fechado


João parou o carro. Cerrando os olhos na movimentada avenida, sentiu no corpo a pulsação saltitante de seu peito intumescido. À sua volta, um estranho mundo a girar , não viu razão para tantas palavras, gritos e ruídos. Por um momento desligou-se, buscando no silêncio o amadurecer de sua existência. E mal sabia este, que era o silêncio o seu sossego. Que era o silêncio a mais estrondosa expressão de si. Voltou à realidade, o sinal abrira. João seguiu em frente com a vida, porém agora, emudecido.

segunda-feira, 25 de março de 2013

De(s)composto

Amadureceu tanto com a situação, que caíra podre, podrinho, putrefazendo-lhe o ser.

Vivacidez

Não te preocupes
,caro vivente,
não importam os
grandes atos.
Do [tudo] pro
[ ] nada
basta apenas
uma palavra
mal dita.

Cortejo

Não se sabe ao certo quem ali lhe acompanhava, as duas damas alternavam à sua companhia, a disputa incessante para preencher-lhe o peito, ora vazio em carne e preenchido por sensações, era assim, cada vez mais alma e menos existir. Mas elas, naquela dança de cortejo, voltavam à disputa, de seus lugares e da companhia. Indeciso, mas certo de si, dispensou a senhora Solidão, e em ato de compromisso, viveu eternamente com a segunda, a senhora Saudade, esta pois, que até o fim de sua existência, fizera-lhe companhia, preenchendo n'alma o buraco da solidão.

domingo, 24 de março de 2013

Segregação egoica

.

No ar taciturno deste quarto
Procuro em mim
O meu ego
Que disfarçado de eu lírico
Vai agregando em palavras
Uma poética
- egoísta-

(in)Felicidade



A vida é boa?
Perguntou o poeta.
Só soube responder,
o seu Zé.

Olhos seus[meus]

E disse a ela
Que seu olhar lhe roubara
A razão, a noção
Dando-lhe um quê de nonsense
E um ar de paixão

Mas faminto pelos versos
Ele tentou, mais uma vez,
Coloca-los em união

Mas ao final, contrariado,
decidira roubar-lhe os olhos
E entregar-te o coração

Excessocético

Nesse emaranhado de ideias, os anseios sugaram-lhe o sentir, secando-lhe a alma, dando voz à razão.

sábado, 23 de março de 2013

Surto


De súbito ocorreu-lhe
um daqueles surtos epistemológicos
-parou, acendeu o cigarro-
resolveu então pensar a vida
vezes descompreendido
descompreendeu toda razão da palavra
-tomou o último gole-
e despensou a vida.

Passagem

E passou de maneira tão
desapercebida
que diante o malgrado
não lhe fora hostil,
deixou apenas este bilhete
saltando-lhe do peito 
a mil.

Hiato patriota


Um pa-ís
que separado por 
duas sílabas
se diz um Bra-sil
de duas realidades:
aquela de desordem
e progresso vil.

Assim notou o despatriota,
que nesta nota,
revelou o grande
- hiato -
deste pa-ís.

Mentira poética



E ao fingir essa toda verdade
Que se divide em des-
-peda-
-ços

-É o poeta-

Das palavras insanamente 
ditas
Em sonhos dissonantes
sonhados

Da embriaguez vocabular
,deste que um dia,
se permitiu escrever.

Sociedade [de(s)valores]


Lenvantou naquela manhã de domingo, 
e como lhe era de costume,
[nesses cinquenta anos]...

bebeu do vinho e
comeu do pão.
Disse amém
e maldisse o profano,
Reprimiu Amélia, sua esposa
E presenteou Tereza, sua amante.

Foi quando enfim,
Se entregou à vida, feliz que tava.
E num desses imprevistos,
e tamanha tragédia,

-Tropeçou e caiu falecido-

Caiu por terra João
e o que o padre dizia,
Jamais fizera sentido.

Etiqueta.


O que dizer de seus modos... 
indelicados e austeros
de como quem

,com plena destreza,

arrancou desta vida,
a razão e sensatez
deixando nos átrios
e ventrículos

apenas sentimentos.

des(Existência)



Era ele, o pequeno poeta,
com ar sôfrego e ideia vil
andava assim... 
displicente.

Como quem fugia de casa,
procurando embaixo do solo
alguns confortávéis palmos.

Foi então que abriu as páginas,
tomou o tinteiro,
cerrou os olhos e

partiu pra vida.